A Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (28) projeto de lei que regulamenta a produção de hidrogênio considerado de baixa emissão de carbono, instituindo uma certificação voluntária e incentivos federais tributários. O Projeto de Lei 2308/23, dos deputados Gilson Marques (Novo-SC) e Adriana Ventura (Novo-SP), será enviado ao Senado.
De acordo com o texto aprovado do relator, deputado Bacelar (PV-BA), será considerado hidrogênio de baixa emissão de carbono aquele que, no ciclo de vida do processo produtivo, resulte em valor inicial menor ou igual a 4 quilogramas de dióxido de carbono equivalente por quilograma de hidrogênio produzido (4 kgCO2eq/kgH2). Esse número representa a intensidade de emissão de gases do efeito estufa, mas deverá ser adotado até 31 de dezembro de 2030, devendo ser regressivo a partir dessa data.
Com tecnologias atuais de captura e uso ou estoque do carbono (CCUS, na sigla em inglês), até mesmo o uso do carvão chega a 2KgCO2eq/KgH2 se a eficiência de captura for de 90%. Com o gás natural, a CCUS garante uma emissão cinco vezes menor, de 0,4 kgCO2/kgH2.
Da produção mundial de hidrogênio em 2020, pouco mais de 10% foi efetuada com baixa emissão de carbono em função de sua captura em plantas industriais de fabricação de fertilizantes, mas a produção total emitiu 900 milhões de toneladas de CO2, quantidade equivalente às emissões anuais conjuntas do Reino Unido e da Indonésia.
O texto também conceitua o hidrogênio renovável como aquele obtido com o uso de fontes renováveis, incluindo solar, eólica, hidráulica, biomassa, biogás, biometano, gases de aterro, geotérmica, das marés e oceânica. Ao longo do tempo, os incentivos tratados no projeto deverão ser gradativamente destinados ao hidrogênio renovável.
Na produção de hidrogênio por eletrólise (separação do hidrogênio e do oxigênio da água), são necessários cerca de 9 litros de água para produzir 1 kg de hidrogênio, produzindo-se 8 kg de oxigênio como um subproduto, que em menor escala pode ser utilizado no setor de saúde ou em maior escala para fins industriais.
Certificação
Apesar de deixar claro que a adesão ao sistema de certificação será voluntária por parte dos produtores de hidrogênio ou de seus derivados, o texto cria o Sistema Brasileiro de Certificação do Hidrogênio (SBCH2).
O certificado atestará a intensidade de emissões de gases do efeito estufa na produção do hidrogênio, devendo os agentes que aderirem cumprirem as regras e a governança.
O sistema contará com uma autoridade competente; uma autoridade reguladora; empresas certificadoras; instituição acreditadora; e gestora de registros.
Enquanto a autoridade competente fixará as diretrizes de políticas públicas relacionadas à certificação, autoridade reguladora fará a supervisão, estabelecendo padrões e requisitos para a certificação e as responsabilidades e obrigações das empresas certificadoras credenciadas. Essa autoridade também fiscalizará a movimentação do hidrogênio comercializado para verificar sua adequação à certificação.
Como a certificação será concedida por empresas especializadas, a permissão para atuarem (acreditação) será feita pela instituição acreditadora, à qual caberá ainda auditar os certificados de hidrogênio emitidos.
No caso da gestora de registros, ela deverá manter uma base de dados nacional dos certificados emitidos e garantir aos compradores a verificação de sua autenticidade. Segundo estudo do BNDES, ainda não há um consenso sobre os critérios a serem aplicados nas certificações do hidrogênio verde, renovável ou de baixo carbono, tampouco na forma de medir as emissões no processo de fabricação e distribuição do hidrogênio.
Padrão brasileiro
O texto de Bacelar cria um “padrão brasileiro” para certificar o hidrogênio de baixa emissão de carbono. O regulamento deverá especificar quais tipos de emissões de gases do efeito estufa deverão ser considerados; quais etapas do processo produtivo deverão ser abrangidas pelo sistema de certificação (fronteira de certificação); os critérios para suspensão ou cancelamento dos certificados; informação sobre emissão negativa, se houver; e instrumentos de flexibilidade que poderão ser adotados em casos de perda temporária de especificação do hidrogênio.
Por outro lado, a autoridade reguladora deverá prever mecanismos de harmonização junto a padrões internacionais de certificação de hidrogênio, podendo prever regras para reconhecimento de certificado emitido no exterior.
Política nacional
O projeto determina que o Programa Nacional do Hidrogênio (PNH2) incorpore a Política Nacional do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono.
O Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) já disciplinou competências e composição do comitê gestor do programa (Coges-PNH2), que conta atualmente com 13 integrantes. O projeto aumenta para até 15, incluindo um representante dos estados e do Distrito Federal; um da comunidade científica; e três do setor produtivo.
Autorização
Quanto ao exercício da atividade de produção de hidrogênio de baixo carbono e de outras associadas, como processamento, tratamento, importação, exportação, armazenagem, estocagem, acondicionamento, transporte, transferência, revenda e comercialização, ela dependerá de autorização emitida pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Essa autorização poderá ser dispensada por regulamento em razão de volume produzido ou uso do hidrogênio como insumo. As empresas que produzem o hidrogênio terão prioridade na tramitação de pedidos de autorização para as demais atividades.
Incentivos tributários
O Projeto de Lei 2308/23 estende às empresas produtoras de hidrogênio de baixo carbono incentivos tributários previstos na Lei 11.488/07, concedendo suspensão de PIS, Cofins, PIS-Importação e Cofins-Importação na compra ou importação de máquinas, aparelhos, instrumentos e equipamentos novos e de materiais de construção destinados aos projetos de hidrogênio. O benefício poderá ser usado ainda para os bens alugados.
Esse benefício pode ser usado por cinco anos, contados da habilitação no Regime Especial de Incentivos para a Produção de Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono (Rehidro), criado pelo projeto.
Bacelar fixa como requisitos para habilitação um percentual mínimo de utilização de bens e serviços de origem nacional no processo produtivo e investimento mínimo em pesquisa, desenvolvimento e inovação. Também deverá haver um percentual máximo de exportação do hidrogênio produzido.
As empresas, inclusive as já atuantes na produção de hidrogênio de baixo carbono, terão cinco anos da publicação da futura lei para se habilitarem ao benefício.
Adicionalmente, poderão ser consideradas co-habilitadas as empresas que atuam nas seguintes áreas:
- acondicionamento, armazenamento, transporte, distribuição ou comercialização de hidrogênio de baixa emissão de carbono;
- geração de energia elétrica renovável para a produção desse tipo de hidrogênio; ou
- produção de biogás ou de biometano para a produção de hidrogênio de baixa emissão de carbono
As empresas optantes pelo Simples Nacional não poderão aderir ao Rehidro e aquelas que usufruírem dos incentivos deverão manter regularidade fiscal.
Programa
Outra fonte de recursos para incentivar o setor será por meio do Programa de Desenvolvimento do Hidrogênio de Baixa Emissão de Carbono (PHBC), instituído pelo texto.
Sua finalidade será bancar a transição energética a partir do uso de hidrogênio de baixa emissão de carbono. Entre os recursos previstos estão:
- dotações orçamentárias;
- recursos de doações de entidades nacionais e internacionais, públicas ou privadas;
- empréstimos de instituições financeiras nacionais e internacionais;
- percentual de lucros excedentes das agências financeiras oficiais de fomento do exercício anterior, a ser definido conforme regulamento
Subvenção
Com o dinheiro obtido, o PHBC poderá conceder subvenção econômica na comercialização de hidrogênio de baixa emissão de carbono e seus derivados.
Para ter acesso a essa subvenção, as empresas produtoras de hidrogênio de baixo carbono interessadas devem participar de uma concorrência com regras propostas pelo comitê gestor do PHN2.
Essa subvenção poderá ser concedida por dez anos.
Segundo o texto de Bacelar, a política de investimentos do PHBC pretende garantir a rentabilidade, a segurança e a liquidez de suas aplicações e assegurar sua sustentabilidade econômica e financeira para o cumprimento dos objetivos da política de hidrogênio de baixo carbono.
A depender da energia utilizada, da fonte de onde se extrai o hidrogênio, das técnicas empregadas e da existência ou não de captura do carbono, a produção do hidrogênio pode apresentar grande diferença de custo final.
Reportagem - Eduardo Piovesan
Edição - Francisco Brandão
Fonte: Agência Câmara de Notícias