O professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Sérgio André Rocha, afirmou que a reforma tributária representa um marco constitucional ao incorporar explicitamente a defesa do meio ambiente como princípio orientador do sistema tributário nacional. A declaração foi feita durante a palestra de abertura do Painel 1 do Simpósio de Instrumentos Fiscais e Tributários Sustentáveis, parte do Global Meeting – Circuito COP30, realizado pela Advocacia-Geral da União (AGU) em parceria com o Instituto Global ESG, em Brasília.
Em sua explanação, Rocha destacou que o novo parágrafo 3º do artigo 145 da Constituição Federal, incluído pela Emenda Constitucional nº 132, determina que o sistema tributário deve obrigatoriamente observar o princípio da proteção ambiental. “Não se trata de um objetivo aspiracional, mas de uma imposição constitucional. O sistema tributário nacional, como um todo, passa a ter a obrigação de se alinhar à defesa do meio ambiente”, afirmou.
O jurista defendeu que essa transformação reforça a função social e ambiental da tributação, permitindo que o direito tributário e o direito financeiro deixem de ser percebidos apenas como áreas técnicas voltadas a números e arrecadação, passando a ser instrumentos de superação de desigualdades sociais, de gênero e raciais, além de instrumentos ativos de enfrentamento à crise climática.
“Direito tributário tem a ver com superação de desigualdade social. Direito financeiro tem a ver com superação de desigualdade de gênero. Finanças públicas têm a ver com superação de desigualdade racial. E tudo isso também tem a ver com a defesa do meio ambiente”, pontuou o professor.
Rocha alertou para o fato de que, durante os debates legislativos da reforma tributária, os dispositivos constitucionais mais inovadores, como o que trata da proteção ambiental, passaram despercebidos por grande parte dos especialistas e legisladores. “Houve uma concentração excessiva nas discussões sobre IBS, CBS, split payment, cashback. Mas o novo parágrafo 3º do artigo 145, que cria uma obrigação ambiental para todo o sistema tributário, foi pouco debatido — e agora exige nossa atenção”, explicou.
Segundo ele, a inclusão desse princípio gera implicações imediatas e de longo prazo. A primeira dúvida que se impõe diz respeito ao alcance temporal do dispositivo: “Estamos diante de uma norma apenas prospectiva, válida para novas leis, ou ela já exige uma reinterpretação de toda a legislação tributária vigente?”, questionou, ressaltando a necessidade de um debate constitucional e jurisprudencial sobre os impactos concretos da mudança.
“Se hoje eu crio um benefício fiscal que resulta em externalidades ambientais negativas, a meu ver ele é inconstitucional. A Constituição agora impõe que o sistema tributário deve observar a defesa do meio ambiente, e isso deve ser levado a sério”, afirmou.
Para o professor, essa transformação coloca o Brasil na vanguarda do constitucionalismo tributário ambiental. Ele destacou que não há conhecimento de outra constituição no mundo que insira, de forma tão clara, a proteção ambiental como princípio orientador do sistema fiscal. “É uma singularidade brasileira que nos obriga a ressignificar a tributação à luz dos grandes desafios do século XXI”, concluiu.
A fala de Sérgio André Rocha abriu os debates do painel “Reforma Tributária, Justiça Fiscal e Sustentabilidade: perspectivas ambientais com o imposto seletivo e o Fundo Regional”, que reuniu também a procuradora da Fazenda Nacional Fernanda Schimitt Menegatti, o presidente do Conselho Regional de Contabilidade do DF, Darlan Barbosa, e o advogado Breno Vasconcelos, sob moderação de Leila de Morais, chefe de gabinete da AGU.
O evento integra a programação do Global Meeting – Circuito COP30, iniciativa do Instituto Global ESG e da Advocacia-Geral da União, com foco na convergência entre instrumentos fiscais e tributários e a agenda da sustentabilidade, em preparação para a COP30 e os 20 anos do conceito ESG.