Durante o Painel 3 do Simpósio de Instrumentos Fiscais e Tributários Sustentáveis, promovido pela Advocacia-Geral da União (AGU) e pelo Instituto Global ESG no âmbito do Global Meeting – Circuito COP30, a Procuradora-Geral da Fazenda Nacional, Anelize Almeida, apresentou uma reflexão contundente sobre a transação tributária como instrumento moderno de justiça fiscal, recuperação econômica e estímulo a práticas sustentáveis. Em sua avaliação, o mecanismo é hoje “a política pública de fiscalidade mais bem-sucedida dos últimos anos no Brasil”.
Segundo Anelize, a transação tributária surgiu em meio a um cenário de créditos considerados irrecuperáveis pela Fazenda Nacional, ainda entre 2016 e 2017. “Foi um esforço coletivo entre a administração pública, a academia e o setor privado que resultou na criação da Lei nº 13.988, que institucionalizou a possibilidade de acordo entre a Fazenda Nacional e contribuintes em débito”, afirmou.
Ela enfatizou que a política não se limita a questões jurídicas e fiscais, mas carrega potencial de transformação social e econômica profunda. “A gente podia mudar o mundo também, com um instituto que era do direito. Quando você vê que pode mudar o mundo a partir de uma estrutura legal, é disso que estamos falando.”
Exemplos práticos de impacto social e econômico
Anelize compartilhou casos emblemáticos que exemplificam os efeitos concretos da transação tributária. Um dos principais destaques foi a regularização fiscal do Grupo João Santos, tradicional conglomerado nordestino com mais de 20 mil empregados. “Após a assinatura da transação, um parlamentar me relatou que o comércio de uma cidade do interior estava em pleno aquecimento, e o motivo era a liberação da primeira parcela da transação do Grupo João Santos. Se isso não é ESG, eu não sei o que é”, declarou.
Outro exemplo mencionado foi a Companhia de Águas do Estado do Pará, que, após firmar acordo com a PGFN, obteve investimentos internacionais de seis bilhões de reais com garantia da União, permitindo levar saneamento básico a mais de 20 mil pessoas. “Isso foi viabilizado por uma transação tributária. Regularizamos a dívida da companhia e ela conseguiu captar recursos com organismos multilaterais para investir em infraestrutura básica. Esse é o papel estratégico da PGFN”, disse.
ESG e inclusão como diretrizes da nova transação tributária
A Procuradora-Geral defendeu a ampliação dos critérios de sustentabilidade e governança nas futuras transações firmadas com contribuintes. Para ela, o instrumento pode — e deve — servir como vetor para a adoção de boas práticas ESG (ambientais, sociais e de governança), inclusive promovendo a diversidade e a equidade de gênero nas estruturas empresariais.
“Podemos estimular empresas a melhorarem a composição dos seus conselhos, a incluírem mais mulheres, mais pessoas pretas, mais representantes de minorias. A transação pode impulsionar esse caminho. Eu sei que a equipe fica louca quando eu falo isso, mas agora vamos confirmar até se o povo está plantando árvore ou não”, brincou, reforçando que as contrapartidas ambientais e sociais não são meramente simbólicas.
Transformações internas e liderança feminina na administração pública
Ao abordar a coerência interna da PGFN com os valores que promove externamente, Anelize ressaltou a diversidade da equipe nacional de transação, com representatividade de diferentes regiões do Brasil, paridade de gênero e atenção ao desenvolvimento regional. “Não adianta ter só gaúcho do interior do Rio Grande do Sul fazendo transação. Precisamos de gente do Brasil inteiro, que conheça a realidade dos locais.”
Ela também destacou a liderança feminina como uma das forças impulsionadoras da inovação na administração pública. “A equipe da PGF é liderada por mulheres. Estamos vivendo uma revolução, e eu me incluo entre essas grandes mulheres — sem nenhuma modéstia, porque eu não saio de casa para ser modesta”, afirmou, sendo aplaudida pelo público presente.
Aumento da efetividade em recuperações judiciais e crédito
A fala de Anelize também trouxe dados relevantes sobre os impactos macroeconômicos da política. Segundo ela, antes da regulamentação da transação tributária, menos de 12% das empresas em recuperação judicial conseguiam concluir seus planos de reestruturação no Brasil. Hoje, esse número ultrapassa 40%, em razão da possibilidade de regularização fiscal com a Fazenda Nacional.
“A regularidade fiscal abre acesso ao crédito, viabiliza planos sustentáveis de recuperação e fortalece a economia. É um ciclo virtuoso que a transação inaugura”, explicou.
Conexão entre ESG, direito e propósito institucional
Encerrando sua intervenção com entusiasmo, a Procuradora-Geral reforçou a importância de integrar propósito institucional às estruturas jurídicas. Para ela, sair da “caixinha do direito” é necessário para transformar realidades. “A gente consegue mudar muito. A transação é mais do que um acordo. Ela é uma política pública de impacto. Se implementada com propósito, pode gerar desenvolvimento, equidade e justiça.”
Painel reúne autoridades e especialistas em justiça fiscal e sustentabilidade
Além de Anelize Almeida, participaram do painel o Procurador-Geral Adjunto da Dívida Ativa da União e do FGTS, João Henrique Grognet; o Diretor da Câmara de Mediação e de Conciliação da Administração Pública Federal (CCAF/AGU), José Roberto Peixoto; e o presidente do Instituto Global ESG, Alexandre Arnone. A mediação foi conduzida por Sóstenes Marchezine, vice-presidente do Instituto Global ESG, diretor-geral do Programa ESG20+ e sócio-diretor da Arnone Advogados.
O painel integrou a programação oficial do Global Meeting – Circuito COP30, promovido pelo Instituto Global ESG e pela AGU, e reforça o compromisso multissetorial com a construção de um sistema fiscal e tributário orientado ao desenvolvimento sustentável.