O primeiro painel do Simpósio de Instrumentos Fiscais e Tributários Sustentáveis, promovido pela Advocacia-Geral da União (AGU) e pelo Instituto Global ESG no âmbito do Global Meeting – Circuito COP30, reuniu juristas, autoridades fiscais e especialistas para debater o papel da reforma tributária na construção de um sistema fiscal mais justo e sustentável.
Com o tema “Reforma Tributária, Justiça Fiscal e Sustentabilidade: perspectivas ambientais com o imposto seletivo e o Fundo Regional”, a mesa de abertura teve mediação de Leila de Moraes, chefe de gabinete da AGU, e contou com exposições de Sérgio André Rocha (professor da UERJ), Fernanda Schimitt Menegatti (Procuradora da Fazenda Nacional), Breno Vasconcelos (Mannrich e Vasconcelos Advogados) e Darlan Barbosa (presidente do CRC/DF e da DF-PREVICOM).
Marco constitucional e tensões jurídicas
A discussão partiu do reconhecimento de que a reforma tributária inaugurou uma nova etapa ao incluir expressamente os princípios de proteção ao meio ambiente e de sustentabilidade na Constituição Federal. “Passamos a ter uma Constituição tributária ambiental. O desafio agora é saber como as instituições vão utilizar essas diretrizes”, afirmou Sérgio André Rocha, que também alertou para o risco de o imposto seletivo ser utilizado prioritariamente com fins arrecadatórios, e não como instrumento de combate a externalidades negativas.
Os painelistas destacaram que a efetividade da norma constitucional dependerá da atuação coordenada dos três Poderes e da aplicação prática dos novos instrumentos. Entre as tensões já identificadas está o conflito entre o princípio da capacidade contributiva — um pilar da justiça tributária — e a lógica do imposto seletivo, que é regressivo por natureza e tende a afetar com mais intensidade as camadas sociais com menor renda.
Critérios, lista de bens e análise regulatória
Fernanda Schimitt Menegatti destacou que a definição dos bens sujeitos ao imposto seletivo será feita por lei complementar e que a estrutura regressiva do tributo exige políticas públicas complementares para mitigar desigualdades. “Estamos começando a perceber a tributação pela perspectiva da sustentabilidade. Essa construção será gradual e participativa”, afirmou.
A exclusão de caminhões da lista de bens a serem tributados e a incidência sobre bens minerais — como minério de ferro e petróleo — foram objeto de intenso debate. Enquanto Breno Vasconcelos considerou equivocada a tributação de insumos que podem ser usados em produtos benéficos, como equipamentos médicos ou torres eólicas, Schimitt defendeu que o foco do imposto está na extração mineral, responsável por impactos ambientais diretos. “O fato gerador é a extração, e não o uso final do insumo”, esclareceu.
Ambos concordaram, no entanto, sobre a necessidade de análises de impacto regulatório ex-ante e ex-post — conforme previsto no art. 37, §16 da Constituição — para aferir se as políticas estão cumprindo seus objetivos e para permitir correções de rota.
O papel do Estado e dos operadores do direito
Darlan Barbosa acrescentou uma perspectiva prática, destacando o papel do Estado como indutor de alternativas sustentáveis reais. “Se queremos que o imposto seletivo induza comportamentos, o Estado precisa oferecer opções viáveis, como outros modais de transporte antes de penalizar o uso de caminhões”, argumentou. Ele também chamou atenção para a “criatividade tributária” de empresas e setores para contornar incidências fiscais, o que exige atenção redobrada na formulação e na fiscalização das políticas públicas.
O painel foi encerrado com reconhecimento ao esforço conjunto das instituições organizadoras e com o convite para aprofundar o debate no âmbito da AGU e em eventos futuros, com o objetivo de fortalecer a governança ambiental e a justiça fiscal à luz da nova ordem constitucional tributária.