18/03/2024 às 14h15min - Atualizada em 18/03/2024 às 14h15min
TRF6 mantém decisão que assegurou matrícula de aluna autodeclarada parda na Universidade Federal de Uberlândia
Decisão seguiu posicionamento defendido em manifestação do MPF
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Freepik Acolhendo manifestação do Ministério Público Federal (MPF), o Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6) suspendeu acórdão anterior e confirmou sentença que assegurou o ingresso de aluna autodeclarada parda na Universidade Federal de Uberlândia (UFU) em 2020, por meio do sistema de cotas. A estudante havia sido desclassificada pela comissão de heteroidentificação da instituição de ensino, sob a justificativa de não possuir características fenotípicas de uma pessoa parda. Ao determinar a matrícula da aluna, o juiz alegou que, no caso de dúvida razoável sobre o fenótipo do candidato, deve prevalecer o critério da autodeclaração da identidade racial.
Mais de três anos depois, em novembro do ano passado, o TRF6 acolheu recurso da Universidade para anular a sentença que assegurou a vaga à candidata. O acórdão apontou que não cabe ao Poder Judiciário intervir em decisão administrativa tomada pela comissão de heteroidentificação. Com isso, a estudante foi impedida de prosseguir seus estudos na UFU, mesmo já tendo cursado quase 70% do curso de agronomia. Inconformada, ela apresentou recurso especial, com pedido de efeito suspensivo, para que o caso seja analisado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Ao analisar o recurso, o MPF deu razão à estudante. A procuradora regional da República Ana Carolina Previtalli apontou falta de isonomia por parte da comissão de heteroidentificação da Universidade. A irmã da estudante, que possui traços fenotípicos muito semelhantes aos dela, teve reconhecida sua condição de pessoa parda pela UFU, o que demonstra a falta critérios objetivos e claros na seleção. Além disso, fotografias da candidata ao lado de sua irmã, pais e avós, anexadas por ela à autodeclaração, revelam inequivocamente seus traços afrodescendentes e sua ancestralidade.
Ainda de acordo com o MPF, a prova documental apresentada foi desconsiderada pela comissão de heteroidentificação da UFU, que sequer justificou adequadamente as razões pelas quais não enquadrou a estudante como pessoa parda, limitando-se a alegar que a candidata “não atende aos critérios fenotípicos (cor de pele, características da face e textura do cabelo)".
Ana Carolina defende que pessoas pardas podem ter tonalidades de pele variadas, especialmente quando não tomam sol, bem como os cabelos também podem ter texturas variadas, especialmente para moças que gostam de tratamentos para o alisamento dos fios, opção que deve ser respeitada. Para a procuradora, obrigar que o cotista siga determinado estereótipo pode trazer uma revitimização do estudante pelo Estado, o que exige grande atenção por parte do Poder Judiciário, diante da importância da política de cotas raciais no ingresso em universidades.
“Ao determinar que o Poder Judiciário não pode substituir a Administração no exercício de discricionariedade vinculada, salvo erro grosseiro, incoerência, abusos ou irregularidades, o TRF-6 divergiu do entendimento de outros Tribunais pátrios que prestigiam a autodeclaração dos candidatos, somada a outros elementos de prova coligados nos autos, sobretudo nos casos enquadrados na denominada ‘zona cinzenta’”, explica a procuradora.
Dessa forma, o MPF defendeu que o recurso especial não busca o reexame do conjunto fático probatório dos autos, mas corrigir a ilegalidade perpetrada pela violação dos dispositivos afrontados pelo acórdão recorrido, além de garantir a uniformização da jurisprudência pátria. O posicionamento foi acolhido pela presidente do TRF6, que admitiu o recurso, com efeito suspensivo, restaurando os efeitos da sentença de primeira instância até que o caso seja julgado pelo STJ.