Freepik Em 18 de junho é comemorado o Dia do Orgulho Autista. A data, criada pelos próprios autistas, surgiu pela falta de representatividade sentida por elas pelas ações promovidas em abril, em razão do Dia Mundial da Conscientização do Autismo.
Ela é uma forma de olharmos para todas as pessoas com autismo, em suas diferentes fases da vida, principalmente adolescentes e adultos. Isso porque, ainda é muito comum que o Transtorno do Espectro Autista seja algo remetido à infância e crianças, o que pode deixar outros autistas sem visibilidade.
Assim, o Dia do Orgulho Autista é feito por e para todos que fazem parte do espectro, como forma de celebrar e reconhecer as diferenças de forma natural e inclusiva em nossa sociedade.
Além disso, a data serve como um reforço ao movimento “Nada sobre nós, sem nós”, que pede a participação de pessoas autistas em eventos, palestras e demais discussões que envolvem o tema, trazendo lugar de fala e representatividade.
André Naves, Defensor Público Federal especialista em Direitos Humanos, destaca a importância do Dia do Orgulho Autista no combate ao estigma e na promoção da inclusão. "O autismo não deve ser visto como uma limitação, mas como uma expressão única do ser humano. É fundamental que observemos e reconheçamos as habilidades e potencialidades das pessoas com o Transtorno do Espectro Autista (TEA). Elas têm muito a oferecer, desde a sua capacidade de concentração até o seu pensamento lógico e a criatividade excepcionais”, afirma Naves.
Neste texto, além de falarmos do significado do Dia do Orgulho Autista, também trazemos trechos escritos por Tiago Abreu, jornalista, autista, autor do livro “O que é neurodiversidade?” e criador do podcast Introvertendo – o primeiro do Brasil feito somente por pessoas autistas.
O que significa o Dia do Orgulho Autista?
A primeira edição do Dia do Orgulho Autista ocorreu em 2005 e foi organizada pela Aspies for Freedom (Aspie é uma forma como muitos autistas se denominam, e é uma nomenclatura derivada de “Asperger”, da Síndrome de Asperger), dos Estados Unidos.
O objetivo era fortalecer o movimento da neurodiversidade e esclarecer a sociedade que o autismo não é uma doença e sim uma condição. Por isso, não existe uma cura para autismo, mas sim intervenções e estratégias corretas para garantir qualidade de vida em diversos aspectos da rotina.
Com esse foco, a data consegue lembrar que pessoas autistas não são doentes, mas apenas possuem barreiras de aprendizado e características únicas que fazem o cérebro processar informações de outra forma.
“Entre outras manifestações, uma das principais em respeito ao Dia do Orgulho Autista é o fato de lembrar que esse dia é para pessoas autistas e sobre elas. Não cabe a quem não está no espectro desqualificar a comemoração ou tecer comentários negativos a respeito dela”, reforça Tiago.
Por que precisamos de um Dia do Orgulho Autista?
O autismo não é um conceito pronto. Ao longo da história, o que chamamos de “autismo” foi se modificando, se ampliando e expandindo.
Principalmente em 2013, quando o autismo passa a ser chamado de Transtorno do Espectro do Autismo, classificado como um dos Transtorno do Neurodesenvolvimento, caracterizado pelas dificuldades de comunicação e interação social e também os comportamentos restritos e repetitivos.
Mas, por muito tempo, se manteve por muito tempo a percepção de autismo como algo fatal, horrível.
Até a década de 1990, não existiam muitas vozes sobre o autismo que falassem sobre o diagnóstico em primeira pessoa, e as principais associações de países como os Estados Unidos, viam o autismo como um vilão, um ladrão que roubava crianças de seus familiares.
Os primeiros ativistas, ainda naquele período, começaram a tensionar aquilo que era estabelecido sobre o diagnóstico. Eles não escondiam a dor e as dificuldades que envolviam a existência enquanto pessoas com deficiência, mas também tentavam equilibrar. Diziam que não era o fim, e que era possível entender o autismo como uma identidade.
Isso se condensou na ideia de orgulho autista, inspirada nos movimentos LGBTQIAP+. Essa visão deu origem ao Dia do Orgulho Autista, criado em 2004 pela organização britânica Aspies for Freedom. Mas, desde o seu surgimento, as pessoas se questionam: orgulho por quê?
É simples. O primeiro passo para tudo é a aceitação, assimilar todos os aspectos que envolvem sua vida e existência, já que só se vive uma vez.
E aceitar a si mesmo é uma forma de empoderamento. Se você tem orgulho de ser autista, a vida fica mais leve. Isso te impulsiona a se entender, se aceitar, a lutar por políticas públicas.
E só há Dia do Orgulho Autista porque um dia ser autista foi visto como tragédia.
Com isso, fica ainda mais claro as diversas nuances e singularidades dentro do autismo, como um espectro, onde cada pessoa pode precisar de certo apoio para atividades diárias ou ter mais ou menos sensibilidade para determinados comportamentos.
Assim, quando falamos sobre o Dia do Orgulho Autista precisamos lembrar que quando conhecemos uma pessoa autista, não conhecemos o autismo, mas sim uma das várias possibilidades deles.
Quando ampliamos as possibilidades de construirmos ambientes diversificados, com diferentes pessoas e possibilidades, é possível aprender que a diversidade faz parte da nossa vida. Isso permite que as pessoas tenham espaços confortáveis para serem quem elas são.
Se refletirmos um pouco, perceberemos que sermos diferentes uns dos outros é a regra, não a exceção.
Como podemos promover cada vez mais o Dia do Orgulho Autista?
Uma das estratégias mais eficazes para combater o estigma e a falta de informação é a educação. Campanhas de conscientização podem ajudar a desmistificar o autismo, fornecendo informações precisas sobre o que significa ser autista.
Isso inclui abordar mitos comuns e fornecer uma compreensão mais profunda das experiências autistas.
Além disso, é claro que precisamos do envolvimento da comunidade e de pessoas autistas. Precisamos ouvir e conhecer cada vez mais pessoas no espectro, só assim poderemos, de fato, ver como o espectro é diversificado.
Por fim, não podemos esquecer que lutar e incentivar políticas públicas que garantam direitos para pessoas autistas é dever de todos. Isso pode envolver desde a melhoria do acesso à educação e ao emprego até a garantia de serviços de saúde apropriados.
Mercado de Trabalho
Nunca se falou tanto sobre inclusão no ambiente corporativo, e naturalmente o assunto também se estende para a discussão sobre neurodiversidade. Há alguns anos, falar sobre autismo no mercado de trabalho ainda poderia ser encarado como um tabu. Já que a falta de informação e também o preconceito poderia levar os empregadores a acreditar que um autista não tem a mesma capacidade de realizar tarefas sob pressão. Ou então, que seria impossível para eles criar relacionamentos favoráveis às atividades das empresas.
Mas, assim como a tecnologia evoluiu, as formas de organização dentro das corporações fez surgir novas possibilidades. Hoje, um autista ter uma carreira já é uma realidade e muitas empresas vem se conscientizando, para então incentivar e absorver o melhor que esses profissionais podem oferecer.
A inclusão de um autista no mercado de trabalho é garantida pela mesma lei que determina a participação mínima para portadores de qualquer deficiência. Foi a Lei 12.764, de 2012 – também conhecida como Lei Berenice Piana – que abriu as portas para o reconhecimento do Autismo dentro do rol das demais deficiências. Desde então, o autismo tem sido muito mais discutido e diagnosticado no país.
Autismo no mercado de trabalho: uma barreira a ser vencida
Apesar de uma previsão otimista para os próximos anos, dados do IBGE dão conta de que 85% dos autistas brasileiros estão fora do mercado de trabalho. É possível que a principal motivação para um número tão baixo aconteça por causa da ideia de imprevisibilidade dessas pessoas. O empregador, muitas vezes, não sabe o que esperar em termos de resultados e comportamentos.
Entretanto, se faltam oportunidades, certamente sobra potencial. Para Liliane Rocha, autora do livro Como ser um líder inclusivo, o que explica a lacuna da participação dos autistas nas empresas é a visão de um ser “exótico”, que não se encaixa em padrões vigentes. Segundo ela, que também é consultora de sustentabilidade e diversidade, a inclusão de profissionais com autismo no mercado de trabalho é capaz de gerar tanto resultado quanto o que se espera dos demais colaboradores.
Como deve ser o espaço de trabalho
Mas é importante entender que empregar um autista, apesar de ser viável em muitos aspectos, o local e o modo de trabalho precisam de adaptações que minimizem as dificuldades naturais da condição.
Uma das primeiras coisas a que o líder deve se atentar é sobre preparar a equipe para receber o novo profissional. É preciso disseminar informações úteis sobre a condição de alguém com Transtorno do Espectro Autista, e incentivar o respeito às possíveis situações de isolamento e dificuldade de expressão.
Outra ideia que pode ser muito eficaz é atribuir ao autista apenas tarefas que demandem alta concentração, baseadas nas melhores habilidades dessa pessoa.
O Dia do Orgulho Autista é mais do que uma simples comemoração; é uma chamada à ação para a aceitação, inclusão e celebração da neurodiversidade.
Promover o orgulho autista é essencial para combater o estigma, melhorar a qualidade de vida dos autistas e criar uma sociedade mais justa e inclusiva.
Este dia nos lembra da importância de valorizar cada indivíduo por quem eles são, reconhecendo que o autismo é uma parte natural da diversidade humana.
Ao nos educarmos e nos envolvemos ativamente na promoção da aceitação, podemos construir uma sociedade onde possam compartilhar suas vivências